domingo, 28 de maio de 2017

Justiça de Transição e os Princípios de Chicago - Síntese do capítulo sobre o problema da anistia no Brasil

Justiça de Transição e Princípios de Chicago

(resumo tirado do livro Justiça de Transição: das anistias às comissões da verdade/ Organizadores: Ana Lúcia Sabadell, Jan-Michael Simon e Dimitri Dimoulis. São Paulo. Revista dos Tribunais 2014)

Justiça de transição pode ser entendida como a realização de justiça, restauração e manutenção da paz em determinado território onde tenham ocorrido graves violações aos direitos humanos. Pode ser denominada, também, de justiça pós-conflito, representando a mudança de um contexto nacional de conflito armado ou de presença de regimes autoritários para um governo democrático calcado na existência de um Estado de Direito. É divida em três fases:

1ª: Tem como marco inicial o pós Segunda Guerra Mundial, sendo caracterizada por um forte internacionalismo e cooperação entre os Estados. Tem como legado a criminalização de condutas violatórias dos direitos humanos. Teve como símbolo os julgamentos de Nuremberg, desenvolvendo-se a partir de 1945, além de consolidar os três pilares: cooperação entre Estados, aplicação da justiça internacional e o desenvolvimento do conceito de reconstrução nacional.

2ª: Associa-se à onda de democratização que tomou forma no período pós Guerra Fria, com o colapso da União Soviética. Na América Latina, foi a queda dos regimes militares estabelecidos, em grande parte na década de 70, que possibilitou essa fase de democratização e reconstrução nacional. Em oposição ao internacionalismo notado na primeira fase, esse momento caracterizou-se pela democratização, modernização reconstrução nacional, considerando-se uma diversidade de condições locais e a variação política de cada nação.

3ª Localiza-se cronologicamente no fim do século XX, estando associada ao fenômeno da globalização, que vem acompanhado da instabilidade política, fragmentação e conflitos perenes. Relaciona-se ao comprometimento com a persecução dos responsáveis pelas violações aos direitos humanos, por meio da expansão do rol desses direitos e a constituição de um novo paradigma de Estado de Direito. Ocorre nessa fase a criação do Tribunal da Antiga Iugoslávia, Tribunal de Ruanda, de Serra Leoa e também a criação do TPI, a partir da ratificação do Estatuto de Roma.

Princípios de Chicago

Nesse contexto, M. Cherif Bassiouni concebeu os Princípios de Chicago, que buscam determinar quais as estratégias e políticas mais eficazes para lidar com necessidades especificadas em cada local, considerando seus aspectos sociais, políticos, culturais e econômicos.

São princípios ordinariamente reconhecidos pelo direito penal internacional.

Estados devem promover a persecução de autores de graves violações aos direitos humanos;

Estados devem respeitar o direito à verdade e fomentar a investigação formal por violações ocorridas;

Necessidade de se conferir um status especial às vítimas, assegurando-se o acesso à justiça e promovendo as devidas reparações. Englobam reparações em pecúnia, restituição ao status quo, garantias de não repetição de violações, assistência psicológica, pedidos de desculpas etc.

Implementação de políticas de veto (vetting policies), sanções e medidas administrativas destinadas à punção dos culpados. Consiste na proibição daqueles que participaram do governo anterior, realizando abusos, de fazer parte das estruturas de segurança, de lideranças políticas etc.

Programas oficiais e inciativas populares que promovam a preservação da memória, transmitindo à sociedade o histórico dos abusos sofridos;

Devem os Estados apoiar e respeitar as abordagens tradicionais, indígenas e religiosas que se manifestem em relação às violações cometidas, geralmente ignoradas nesse processo de transição;

Estados devem promover reformas institucionais de apoio ao Estado de Direito, restaurando a confiança pública, e um sistema de proteção de direitos fundamentais.