quinta-feira, 11 de agosto de 2022

Novo Incidente de Deslocação de Competência admitido pelo STJ (2022)

Na data de 10/08/2022 foi veiculado no site do STJ a admissão do IDC (incidente de deslocamento de competência) de n° 9, que versa sobre a Chacina Parque Bistrol. 

Segue breve notícia sobre o caso:

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu nesta quarta-feira (10) um Incidente de Deslocamento de Competência (IDC) e determinou a reabertura e a transferência, para a Justiça Federal, de inquéritos relativos ao caso conhecido como Chacina do Parque Bristol –  série de assassinatos cometidos em maio de 2006 por grupo de extermínio supostamente ligado a agentes de segurança pública de São Paulo, como represália a ataques da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). 

Ao deferir o IDC, o colegiado considerou, entre outros elementos, a existência de indícios de graves violações de direitos humanos no caso e a possibilidade de responsabilização do Brasil em razão de tratados internacionais assinados pelo país. O julgamento teve a participação, como amicus curiae, da Associação de Direitos Humanos em Rede – Conectas Direitos Humanos. Inserida no período conhecido como Maio Sangrento, a Chacina do Parque Bristol foi um ataque cometido por homens encapuzados contra cinco pessoas que estavam no bairro de mesmo nome, localizado na Zona Sul de São Paulo. Na ação, três pessoas morreram baleadas. 

Segundo os autos, logo após o crime, uma viatura da Polícia Militar teria passado pelo local para recolher cartuchos e projéteis que estavam no chão. Meses após esse episódio, um dos sobreviventes foi morto a poucos metros do local onde havia sido atingido na primeira vez. Como consequência da chacina, foram instaurados dois inquéritos policiais. 

No primeiro deles, a polícia entendeu não haver elementos suficientes de autoria, motivo pelo qual o Ministério Público de São Paulo requereu o arquivamento, que foi deferido pelo juiz; no segundo, também arquivado, o Ministério Público Federal alegou que não foram juntados exames periciais importantes para a elucidação dos fatos. A Corte IDH deve julgar responsabilização do Brasil pela chacina.

 Autora do IDC, a Procuradoria-Geral da República (PGR) justificou a necessidade de remessa do caso da Justiça de São Paulo para a Justiça Federal em razão de falhas na condução das investigações pelas autoridades estaduais. A PGR também destacou que foi apresentada à Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) um pedido de responsabilização do Brasil pelo episódio.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

ATUALIZAÇÃO - SÍNTESE DAS OPINIÕES CONSULTIVAS (ATÉ 2021)

Olá, pessoal!

Com as atualizações de estilo, segue a compilação das opiniões consultivas emanadas pela CorteIDH, com as atualizações até a OC nº 28.

Bons estudos. 


QC 1/82 (Peru) Sobre o alcance da expressão "outros tratados" do art. 64 da Convenção. A CorteIDH entendeu que pode opinar sobre toda e qualquer disposição concernente a proteção dos direitos humanos e que os Estados Americanos estejam submetidos, não importando se bilaterais ou multilaterais. A Corte, ainda, poderá não  opinar se entender que o objeto do questionamento foge às suas atribuições. 

OC 2/82 (Comissão) Interpretação dos arts. 74/75, momento da obrigatoriedade do tratado, solicitado pela Comissão. A Corte entende que a Convenção obrigada o Estado que a ratificou com ou sem reservas a partir do momento do depósito do instrumento de adesão.

OC 3/83 (Comissão) Sobre impossibilidade de adoção da pena de morte na Guatemala. A Convenção impõe uma proibição absoluta quanto à extensão da pena de morte a crimes adicionais, ainda que uma reserva a essa relevante previsão da Convenção tenha entrado em vigor ao tempo da ratificação. Proibição do retrocesso. 

OC 4/84 (Costa Rica) Sobre a compatibilidade dos artigos sobre naturalização da Constituição da Costa Rica. A Corte enfatizou a discricionariedade que os Estados têm em relação às regras de naturalização, mas lembrou que deve ser obedecido o princípio da não-discriminação. 

OC 5/85 (Costa Rico) Corte considerou que a lei da Costa Rica que obriga jornalistas a terem diploma universitário e a filiarem-se ao Conselho Profissional dos Jornalistas viola a Convenção tanto na liberdade de expressão, quanto no direito à informação de todos.

OC 6/86 (Uruguai) Questionou-se a expressão "leis" utilizada pela disposição do art. 30 da Convenção. Seria uma lei em sentido formal - norma jurídica emanada do Parlamento e promulgada pelo Poder Executivo, segundo as formas requeridas pela Constituição -. ou se, ao contrário, é usada no sentido material, como sinônimo de ordenamento jurídico, prescindindo do procedimento de elaboração e da categoria normativa que lhe possa corresponder na escada hierárquica da respectiva ordem jurídica. 

A Corte opinou no sentido de que a palavra "leis" no art. em tela significa norma jurídica de caráter geral visando ao bem comum, emanada dos órgãos legislativos constitucionalmente previstos e democraticamente eleitos, elaborada conforme o procedimento estabelecido pelas constituições dos Estados-partes para produção de leis.


OC 7/86 (Costa Rica) Sobre direito de retificação e resposta. A Corte entendeu que todo o Estado ratificante da Convenção deve garantir o direito de retificação e resposta aos seus jurisdicionados, frente aos meios de comunicação, bem como os recursos necessários para fruição do direito. 

OC 8/87 (Comissão) Garantias processuais em tempo de emergência, solicitada pela Comissão; A Corte entendeu que a garantia do HC não pode ser suspensa em situações de emergência, respeitando o art, 27 da Convenção.  

OC 9/87 (Uruguai) Garantias judiciais e estado de emergência. As garantias judiciais indispensáveis para a proteção dos direitos humanos não são suscetíveis de suspensão, segundo o art. 27.2.

OC 10/89 (Colômbia) Interpretação do art. 64 da Convenção frente a Declaração Americana dos Direitos do Homem. A Corte entendeu ser competente para opinar sobre interpretação de qualquer artigo da Declaração Americana dos Direitos do Homem. 

OC 11/09 (Comissão) Sobre as exceções ao esgotamento dos recursos internos.
Não se pode exigir  o esgotamento dos recursos internos se o solicitante não pode ser assistido por advogado por indigência ou temor generalizado dos advogados em representá-lo, bem como no caso de não haver instrumentos internos capazes de garantir o devido processo legal ou por impossibilidade de acesso aos mesmos. 

OC 12/91 (Costa Rica) Compatibilidade de projeto de lei de processo penal com o art. 8.2 da Convenção, solicitada pela Costa Rica. A Corte decidiu não responder a consulta pela Costa Rica por entender que poderia causar uma certa legitimação da legislação que poderia causar algum dano à pessoa determinada. 

OC 13/93 (Uruguai) A Comissão é competente para qualificar qualquer norma de direito interno como violadora das obrigações assumidas pelo Estado da Convenção. Opina, também, a Corte, que os arts. 50/51 da Convenção contemplam dois relatórios separados, cujo conteúdo pode ser similar, o primeiro dos quais não pode ser publicado. O segundo pode ser publicado após prévia decisão da comissão, adotada por maioria dos votos, depois de passado o prazo outorgado ao Estado para tomar as medidas adequadas. 

OC14/94 (Comissão) Responsabilidade do Estado e seus agentes por edição e aplicação de leis contrastantes com a Convenção. O Estado é responsável, internacionalmente, no caso de edição de ato normativo que viole os direitos da Convenção, se estes atos atingirem direitos de pessoas determinadass. Os agentes são responsáveis internacionalmente se tais atos constituírem crimes. 

OC 15/97 (Chile) Relatórios. A Comissão não pode modificar relatórios, conclusões ou recomendações destinadas aos Estados-membros, a não ser que haja pedido de modificação antes da publicação do relatório e seja dada a outra parte oportunidade de exercer o contraditório. 

OC 16/99 (México) Direito à assistência consular por presos estrangeiros, solicitado pelo México devido ao grande número de presos nos EUA. A Corte entendeu que viola o devido processo legal a não notificação do preso estrangeiro à assistência consular. 

OC 17/02 (Comissão) Sobre o alcance das garantias processuais/judiciais às crianças. 
A Corte entendeu que o art. 19 da Convenção não deve ser interpretado no sentido de diminuir as garantias das crianças, pois a proteção do melhor interesse da criança é diretriz primária dos direitos das crianças bem, como a busca pelo reconhecimento delas como sujeitos de direito. 

OC 18/03 (México) O princípio fundamental da igualdade e não-discriminação gera obrigações aos Estados, independente da condição migratória dos destinatários. O devido processo legal deve ser reconhecido a todo emigrante, independente da condição migratória.

OC 19/05 (Venezuela) Controle de legalidade da Comissão. 
A Comissão tem plena autonomia e independência no exercício de seu mandato, dentro do marco legal atribuído pela convenção no procedimento relativo ao trâmite de petições individuais, e que a Corte é quem tem atribuição para verificar a igualdade dos atos da Comissão. 

OC 20/09  (Argentina) A nomeação do juiz ad hoc só se dá nos casos de comunicação interestaduais, não sendo possível nos casos de petições individuais. Que no último caso, o juiz do Estado demandado não pode e não participará do julgamento. 

OC 21/14 (BRA, ARG, Paraguai e Uruguai) Sobre a concessão de direitos e garantias à crianças no contexto de migração e/ou em necessidade de proteção internacional. A CorteIDH determinou com maior precisão quais são as obrigatórias dos Estados em relação às medidas a serem adotadas sobre crianças em condição migratória e também em relação aos seus pais nesta condição. 

OC 22/16 (Panamá) Titularidade de direitos por Pessoa Jurídica no Sistema Interamericano. 
Alcance da ConvençãoADH e do Protocolo  de San Salvador sobre a possibilidade das Pessoas Jurídicas poderem  ser consideradas como legitimadas ativas dos direitos estabelecidos nestas convenções.

A interpretação do 1.2 da CADH não concebe aplicação às pessoas jurídicas, não sendo estas titulares de direitos convencionais, pois não pode ser consideradas vítimas nos processos contenciosos do Sistema Interamericano. 
A CorteIDH reiterou que as comunidades indígenas são titulares de direitos protegidos pelo SIDH e podem apresentar-se perante este em defesa de seus direitos e de seus membros, pois são titulares de certos direitos humanos. 

Concluiu que os sindicatos são titulares dos direitos estabelecidos no 8.1., lhes permitindo litigar perante o SIDH em defesa de seus próprios direitos. Limitados aos sindicatos pertencentes aos Estados que ratificaram o protocolo. 

Não há, por outro lado, competência para apreciação em que se alegue o direito de greve.

Quanto ao direito das pessoas naturais através das pessoas jurídicas, a Corte sustentou que o indivíduo pode se socorrer do sistema para fazer valer seus direitos fundamentais mesmo quando tais direitos estejam encobertos por uma figura de ficção jurídica, mas que somente diante do caso concreto é que se poderá provar o vínculo e os direitos vulnerados sem que se tenha que estabelecer uma fórmula única e determinada para isto. 



ATUALIZAÇÃO 2018
OC 24 GÊNERO, ALTERAÇÃO NOME, FOTO E PROCEDIMENTOS 

A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) publicou ontem (9) Opinião Consultiva Nº 24, que trata do tema identidade de gênero e não discriminação de casais do mesmo sexoO documento atende solicitação feita pelo governo da Costa Rica para que a Corte interpretasse as garantias estabelecidas pela Convenção Americana de Direitos Humanos no que se refere ao reconhecimento da mudança de nome de acordo com a identidade de gênero e também sobre o reconhecimento dos direitos econômicos derivados de união homoafetiva.
 
A Opinião Consultiva reitera a jurisprudência da CIDH no sentido de que a orientação sexual e a identidade de gênero são direitos protegidos pelo Pacto de San Jose. Segundo a Comissão, o direito à identidade de gênero está vinculado às garantias de liberdade e de autodeterminação e seu reconhecimento por parte dos Estados integrantes da OEA é de vital importância para o pleno gozo dos direitos humanos.



 08/02/2018

OPINIÓN CONSULTIVA OC-23/17 DE 15 DE NOVIEMBRE DE 2017 SOLICITADA POR LA REPÚBLICA DE COLOMBIA 

MEDIO AMBIENTE Y DERECHOS HUMANOS (OBLIGACIONES ESTATALES EN RELACIÓN CON EL MEDIO AMBIENTE EN EL MARCO DE LA PROTECCIÓN Y GARANTÍA DE LOS DERECHOS A LA VIDA Y A LA INTEGRIDAD PERSONAL - INTERPRETACIÓN Y ALCANCE DE LOS ARTÍCULOS 4.1 Y 5.1, EN RELACIÓN CON LOS ARTÍCULOS 1.1 Y 2 DE LA CONVENCIÓN AMERICANA SOBRE DERECHOS HUMANOS) 


Atualização em 13.04.2019


(2018)
SOLICITANTE: EQUADOR
ASSSUNTO: DIMENSÕES DOS ASILOS TERRITORIAL E  
DIPLOMÁTICO 

 O art. 22.7 da CADH contempla apenas o asilo territorial. A questão é resolvida pelo termo “em território estrangeiro”, cuja interpretação restringe o alcance dos artigos ao asilo territorial, onde o indivíduo se encontra no território do Estado onde busca asilo.

O asilo diplomático é um costume regional, mas sem caráter obrigatório, entendendo a Corte que os Estados são livres e soberanos para regular a questão internamente ou, ainda, firmar acordos entre si sobre a questão. Reconhecida a incidência do princípio do non refoulement ao asilo diplomático, bem como a existência de imposição de obrigações positivas ao Estado que abriga o asilado em suas dependências diplomáticas em outro país, como a avaliação dos riscos a que se expõe o indivíduo, a proteção da pessoa e de seus direitos e, ainda, o dever de buscar a concessão de salvo-conduto para o asilado.

Atualização OC 26/2020 (Colômbia) 
A CorteIDH sobre efeitos da saída de um Estado dos tratados de Direitos Humanos do SIDH e da OEA.
Conforme o blog JUSTICIA EN LAS AMÉRICAS: A Opinião Consultiva (OC) 26 da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CtIDH), de 9 de novembro de 2020, explicitou os efeitos jurídicos em matéria de direitos humanos gerados pela saída de um Estado da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH) e da Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA).

As duas primeiras perguntas apresentadas pela Colômbia diziam respeito às obrigações em matéria de direitos humanos que subsistem para um Estado membro da Organização dos Estados Americanos (i) que denuncia a Convenção Americana e (ii) que, não sendo parte da CADH, denuncia a Carta da OEA. Ao respondê-las, a Corte reforçou interpretações anteriores sobre obrigações derivadas principalmente do artigo 78 da CADH e do artigo 143 da Carta da OEA. Em ambos os casos reafirmou que as obrigações permanecem intactas até a denúncia efetiva ocorrer, que a retirada não possui efeito retroativo, mantendo o poder de se pronunciar sobre atos iniciados no período de vigência do tratado ou antes da denúncia efetiva e continuados no tempo, além do dever de cumprir com obrigações estipuladas pelos respectivos órgãos de monitoramento. Em qualquer caso se explicita que “as normas consuetudinárias, as derivadas de princípios gerais de direito e as pertinentes ao jus cogens continuam a vincular o Estado em virtude do direito internacional geral” (para. 175). Cuida-se de uma afirmação importante vez que, em tempos recentes, a Corte Interamericana parece particularmente inclinada a reconhecer regras dessa natureza. Em outras palavras, ainda que ocorra a saída do tratado, os Estados permanecem vinculados a um conjunto de normas e intepretações que fazem parte do direito consuetudinário geral ou regional.



noção de garantia coletiva é cardeal na OC-26/20, definida como uma obrigação de proteção erga omnes partes “que possuem tanto os Estados Partes da Convenção [Americana sobre Direitos Humanos] como os Estados Membros da OEA entre si, para assegurar a efetividade desses instrumentos” (para. 164). Ainda que seja uma obrigação cujo controle de descumprimento não estaria delegado a um órgão específico da OEA, a Corte derivou uma série de comportamentos esperados dos demais Estados para a salvaguarda dos direitos humanos no continente. A CtIDH também apontou como “central” que os demais Estados avaliem o contexto político do país denunciante. Logo, eles devem indagar se a retirada se deu, por exemplo, como uma resposta a uma decisão emitida pelo sistema que os desagradou, em contextos de exceção ou sob uma erosão democrática.

 Considerações finais Na OC-26/20, a Corte Interamericana manteve sua tendência expansiva no uso dos poderes procedimentais para avançar temas relevantes aos direitos humanos no continente e reforçou as práticas do sistema perante denúncias à CADH e a à Carta da OEA. Sua importância maior reside no chamado ao dever de cooperação dos Estados americanos para o reforço do Sistema Interamericano, o que impactará o atual momento de sua contestação.


OC 27/2021- DIREITOS SINDICAIS (solicitada pela CIDH)


1. Liberdade sindical: sindicatos devem gozar de proteção específica, além da função de sindicalizado. Deve garantir personalidade jurídica;
2. Negociação coletiva: entende que a negociação é expressão da liberdade. A negociação nunca poderá ser in pejus;
3. Greve como direito fundamental, que garante outros direitos (sindicais, laborais etc.);
4. Mulheres: mesmos direitos que os homens (líder sindical). Tutela da mulher grávida e mãe. Igualmente do homem pai. Vedação à discriminação às mulheres. Prevenção à violência sexual nas relações de trabalho;
5. Tecnologia e mercado de trabalho: proteção dos trabalhadores em face das evoluções digitais e alterações das relações de trabalho.

OC 28 -  POSSIBILIDADE OU NÃO ELEIÇÕES POR TEMPO INDEFINIDO

A Corte foi solicitada pela Colômbia sobre o assunto. CorteIDH entendeu que é inconvencional a eleição indefinida. 
O Art. 23 da CADH deve ser interpretado de acordo com a democracia representativa e o Estado Democrático de Direito.
Democracia deve ser um regime que protege às minorias e não a ditadura da maioria. 
Não existe direito humano autônoma à eleição indefinida. 




Nova condenação do Brasil na CorteIDH: Caso Márcia Barbosa e outros vs Brasil - Resumo da sentença

 Olá pessoal!

Segue abaixo o resumo da sentença do caso Barbosa e outros vs. Brasil. Além da sua importância na luta contra o feminicídio, com certeza será cobrado em certames da Defensoria Pública. 

O caso ocorreu no Estado da Paraíba. Assim, a sentença citará pesquisas sobre a questão de gênero relativas ao referido Ente. 

Bons estudos.


Em 7 de setembro de 2021, a Corte Interamericana de Direitos Humanos proferiu sentença mediante a qual declarou a responsabilidade internacional da República Federativa do Brasil pelas violações dos direitos às garantias judiciais, à igualdade perante a lei e à proteção judicial, com relação às obrigações de respeitar e garantir direitos sem discriminação e ao dever de adotar disposições de direito interno e com a obrigação de atuar com a devida diligência para prevenir, investigar e sancionar a violência contra a mulher, em prejuízo de M.B.S e S.R.S., mãe e pai de Márcia Barbosa de Souza.

Consoante o histórico, as violações são oriundas da aplicação indevida da imunidade parlamentar em benefício do principal responsável pelo homicídio, da falta de devida diligência nas investigações realizadas sobre os fatos, do caráter discriminatório em razão de gênero de tais investigações, assim como da violação do prazo razoável

Por conseguinte, declarou-se o Estado responsável pelas violações dos artigos 8.1, 24 e 25 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em relação aos artigos 1.1 e 2 do mesmo instrumento e do artigo 7.b da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher. 

Ademais, o Tribunal declarou o Estado responsável pela violação do direito à integridade pessoal, reconhecido pelo artigo 5.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, com relação ao artigo 1.1 do mesmo instrumento, em prejuízo de M.B.S e S.R.S. *

 A violência contra as mulheres no Brasil era, na data dos fatos do presente caso — e continua sendo na atualidade — um problema estrutural e generalizado. Entre 2006 e 2010, os dados da Organização Mundial de Saúde sobre os homicídios de mulheres, coletados em 84 países, colocaram o Brasil em sétimo lugar. A Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, em 2015, e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, em 2016, qualificaram o Brasil como o país com a quinta taxa mais alta do mundo de homicídios de mulheres por razões de gênero. Por outro lado, no Estado da Paraíba, observa-se que as taxas de homicídio de mulheres entre os anos 1990 e 2000 não variaram substancialmente. 


No entanto, em 2017 o número de mulheres assassinadas por cada 100 mil habitantes quase duplicou em relação a 1990. Há um significativo recorte de raça nas mortes violentas de mulheres no Brasil. De forma geral, a taxa de vitimização das mulheres negras no país é 66 vezes superior à de mulheres brancas. O perfil específico de mulheres assassinadas em maior número no Brasil corresponde a mulheres jovens, negras e pobres. De igual modo, entre os anos 2000 e 2017, o número de mulheres negras assassinadas duplicou. 


Em 2018, a taxa de mulheres negras assassinadas no Estado da Paraíba foi quatro vezes maior que a taxa de homicídios de outras mulheres. 

b. O homicídio de Márcia Barbosa de Souza Márcia Barbosa de Souza era uma estudante afrodescendente de vinte anos de idade, em situação de pobreza, residente na cidade de Cajazeiras, localizada no interior do Estado da Paraíba, no Brasil. Vivia com seu pai, S.R.S., e sua irmã mais nova, Mt.B.S., e muito próximo da casa de sua mãe, M.B.S.


Em 13 de junho de 1998, Márcia Barbosa e sua irmã Mt.B.S. viajaram a João Pessoa capital da Paraíba. Em 17 de junho de 1998, aproximadamente às 19 horas, Márcia Barbosa recebeu uma ligação do então deputado estadual da Paraíba Aércio Pereira de Lima, quem conhecia desde novembro de 1997. Posteriormente, às 21 horas, Márcia Barbosa e o senhor Pereira se encontraram no Motel Trevo, de onde Marcia conversou com várias pessoas através do celular utilizado pelo senhor Pereira. Uma delas inclusive falou com o então deputado. Em 18 de junho de 1998, um transeunte observou que alguém estava retirando o corpo de uma pessoa, posteriormente identificada como Márcia Barbosa de Souza, de um veículo em um terreno baldio, no bairro Altiplano Cabo Branco, próximo à mencionada cidade de João Pessoa


Quando o corpo foi encontrado, Márcia Barbosa de Souza apresentava escoriações, hematomas e vestígios de areia. Ademais, a autópsia revelou que a cavidade craniana, torácica, abdominal e o pescoço apresentavam hemorragia interna e, como causa de morte, determinou a asfixia por sufocamento, resultante de uma ação mecânica. Por sua vez, o perito médico-legal que examinou o cadáver determinou que a senhora Barbosa havia sido agredida antes de morrer. c. Os processos internos Em 19 de junho de 1998, iniciou-se formalmente a investigação policial sobre a morte de Márcia Barbosa. Em 21 de julho de 1998, o Delegado de Polícia encarregado da investigação emitiu um relatório que indicou a participação direta do então deputado Aércio Pereira de Lima no crime, além de indícios da participação de outras quatro pessoas: D.D.P.M., L.B.S., A.G.A.M. e M.D.M. 

Em 8 de outubro de 1998, em virtude da imunidade parlamentar usufruída pelo então deputado estadual, o Procurador-Geral de Justiça apresentou a ação penal perante o Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, com a reserva de que apenas poderia ter seu início se a Assembleia Legislativa o permitisse. A esse respeito, em 14 de outubro de 1998 e 31 de março de 1999, solicitou-se a respectiva autorização, a qual foi negada em 17 de dezembro de 1998 e 29 de setembro de 1999, respectivamente. A partir de 12 de abril de 2002, o Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba realizou diligências que culminaram com o parecer do Procurador-Geral de Justiça. Este argumentou que, em razão das modificações introduzidas pela Emenda Constitucional 35/2001 (doravante denominada “EC 35/2001”), era competência do Poder Judiciário dar continuidade al caso. Em 14 de março de 2003, o processo penal contra o senhor Pereira teve início formalmente perante o Juízo de primeira instância de João Pessoa. Em 27 de julho de 2005, foi proferida a sentença de pronúncia, de modo que se confirmou que o acusado seria submetido ao Tribunal do Júri, diante da existência de indícios suficientes de autoria do crime de homicídio qualificado por motivo fútil e mediante asfixia, e por ocultação de cadáver. A defesa do senhor Pereira recorreu. Em 26 de setembro de 2007, o Primeiro Tribunal do Júri de João Pessoa o condenou a 16 anos de prisão pelos delitos de homicídio e ocultação do cadáver de Márcia Barbosa de Souza. Em 27 de setembro de 2007, o senhor Pereira recorreu da sentença. Em 12 de fevereiro de 2008, antes de que tal recurso pudesse ser examinado, Aércio Pereira de Lima morreu de infarto, extinguindo- se, assim, a punibilidade e arquivando-se o caso. Quanto às investigações conduzidas pela Polícia Civil com relação a D.D.P.M., M.D.M., L.B.S. e A.G.A.M, em março de 2003, o Ministério Público recomendou o arquivamento dos autos por insuficiência de provas, o que foi determinado pelo Juiz


II. EXCEÇÕES PRELIMINARES E CONSIDERAÇÃO PRÉVIA O Estado opôs três exceções preliminares. Sobre a alegada incompetência ratione temporis a respeito dos fatos anteriores à data de reconhecimento da competência da Corte, esta encontrou parcialmente fundada a exceção preliminar. Quanto à alegada falta de esgotamento de recursos internos, a Corte desestimou tal exceção. Finalmente, sobre a alegada incompetência ratione personae quanto às vítimas não listadas no Relatório da Comissão, e posteriormente retificada como “questão prévia à análise de mérito”, a Corte fez notar que esta alegação não constitui uma exceção preliminar, razão pela qual procedeu a examiná-la no capítulo de consideração prévia. A esse respeito, este Tribunal considerou como supostas vítimas à mãe e ao pai de Márcia Barbosa de Souza, conforme identificados no Relatório de Mérito da Comissão Interamericana. 


III. MÉRITO A. Direitos às garantias judiciais, à igualdade perante a lei e à proteção judicial, com relação às obrigações de respeito e garantia, ao dever de adoptar disposições de direito interno e às obrigações previstas no artigo 7 da Convenção de Belém do Pará A Corte realizou algumas considerações gerais sobre a imunidade parlamentar, tendo em vista que foi a primeira vez que a analisou no âmbito do direito de acesso à justiça e da obrigação reforçada de investigar com devida diligência. 

Posteriormente, examinou sua aplicação, no caso concreto, considerando, ademais, que o presente concerne apenas à imunidade parlamentar formal ou processual. A esse respeito, a Corte assinalou que a imunidade parlamentar é um instituto que foi idealizado como uma garantia de independência do órgão legislativo em seu conjunto e de seus membros, e não pode conceber-se como um privilégio pessoal de um parlamentar


Nessa medida, cumpriria o papel de garantia institucional da democracia. Não obstante, sob nenhuma circunstância, a imunidade parlamentar pode transformar- se em um mecanismo de impunidade, questão que, caso ocorresse, acabaria erodindo o Estado de Direito, seria contrária à igualdade perante a lei e tornaria ilusório o acesso à justiça das pessoas prejudicadas. O Tribunal considerou que, diante de um caso concreto, a decisão sobre a aplicação ou levantamento da imunidade parlamentar processual pelo órgão parlamentar, deve: i) seguir um procedimento célere, previsto em lei ou no regimento interno do órgão legislativo, que contenha regras claras e respeite as garantias do devido processo; ii) incluir um teste de proporcionalidade estrito, através do qual se deve analisar a acusação formulada contra o parlamentar e levar em consideração o impacto ao direito de acesso à justiça das pessoas que podem ser afetadas e as consequências de se impedir o julgamento de um fato delitivo, e iii) ser motivada e ter sua motivação vinculada à identificação e justificativa da existência ou não de um fumus persecutionis no exercício da ação penal proposta contra o parlamentar. 


O Tribunal concluiu que o marco jurídico constitucional da Paraíba e regulamentar no Brasil, na data dos acontecimentos, obstaculizou de forma arbitrária o acesso à justiça dos familiares de Márcia Barbosa Souza, ao não prever os critérios que deveriam ser levados em consideração na análise do pedido de licença prévia, a necessidade de motivação da decisão ou o prazo para a decisão final. Ademais, a falta de motivação das duas decisões adotadas pela Assembleia Legislativa da Paraíba indica que esta não procedeu à realização de um teste rigoroso de proporcionalidade, através do qual seria levado em consideração o impacto no direito de acesso à justiça das pessoas que poderiam ser prejudicadas por estas decisões. De igual modo, determinou que a negativa de levantamento da imunidade parlamentar propiciou a impunidade do homicídio da senhora Barbosa de Souza, tornando ilusório o efetivo acesso à justiça de seus familiares no presente caso. 


Quanto à investigação sobre os demais suspeitos, a Corte indicou que, apesar dos fortes indícios de que a morte violenta de Márcia Barbosa de Souza foi resultado de violência de gênero, o Estado não realizou qualquer diligência probatória para determiná-lo. Ao examinar o acervo probatório do presente caso, a Corte constatou que, embora existissem indícios que que apontavam na direção da possível participação de outras pessoas no homicídio de Márcia Barbosa de Souza, não foram realizadas uma série de diligências investigativas relevantes por parte da Polícia Civil da Paraíba, e concluiu que o Estado não cumpriu sua obrigação de atuar com a devida diligência para investigar seriamente e de forma completa a possível participação de todos os suspeitos do homicídio de Márcia Barbosa

Sobre a garantia do prazo razoável, a Corte considerou que, no presente caso, não era necessário analisar os quatro elementos estabelecidos na sua jurisprudência, uma vez que o atraso no andamento do processo deveu-se principalmente aos quase cinco anos durante os quais a ação penal não pôde ser iniciada, dado à negativa arbitrária por parte da Assembleia Legislativa em conceder a licença prévia para o processo penal do então deputado Aércio Pereira de Lima. 

De igual modo, considerou que a aplicação arbitrária da imunidade parlamentar, a demora excessiva e a sensação de impunidade gerada pela falta de resposta judicial agravaram a situação dos familiares de Márcia Barbosa, somados aos quase 10 anos transcorridos desde os fatos do presente caso até a sentença penal condenatória em primeira instância. Portanto, o Tribunal concluiu que o Brasil violou o prazo razoável na investigação e na tramitação do processo penal relacionados com o homicídio de Márcia Barbosa de Souza

*um dos pontos mais importantes da sentença (a seguir)

Com relação à alegada utilização de estereótipos de gênero nas investigações, a Corte recordou sua jurisprudência sobre o alcance e o conteúdo dos artigos 1.1 e 24 da Convenção Americana e verificou que, no caso sub judice, existiu uma intenção de desvalorizar a vítima mediante a neutralização de valores. Com efeito, durante toda a investigação e o processo penal, o comportamento e a sexualidade de Márcia Barbosa passaram a ser um tema de especial atenção, provocando a construção de uma imagem de Márcia como geradora ou merecedora do ocorrido e desviando o foco das investigações por meio de estereótipos relacionados com aspectos de sua vida pessoal, que, por sua vez, foram utilizados como fatos relevantes para o próprio processo. Assim, o Tribunal concluiu que a investigação e o processo penal relacionados ao homicídio de Márcia Barbosa de Souza tiveram um carácter discriminatório por razão de gênero e não foram conduzidos com uma una perspectiva de gênero de acordo com as obrigações especiais impostas pela Convenção de Belém do Pará. 


Diante de todo o exposto, a Corte considerou que o Brasil violou os direitos às garantias judicias, à igualdade perante a lei e à proteção judicial, estabelecidos nos artigos 8.1, 24 e 25 da Convenção Americana, com relação aos artigos 1.1 e 2 do referido tratado, bem como às obrigações contempladas no artigo 7.b da Convenção de Belem do Pará, em prejuízo da senhora M.B.S. e do senhor S.R.S. B. Direito à integridade pessoal dos familiares de Márcia Barbosa de Souza A Corte apontou que o acervo probatório do presente caso permitiu constatar que a senhora M.B.S. e o senhor S.R.S. padeceram de um profundo sofrimento e angústia em detrimento de sua integridade psíquica e moral, devido: i) ao homicídio de sua filha; ii) à atuação das autoridades estatais durante a investigação sobre o ocorrido; iii) à cobertura midiática do caso que especulou sobre a vida pessoal e a sexualidade de Márcia e reforçou estereótipos de gênero; e iv) à homenagem realizada ao ex-deputado no Salão Nobre da Assembleia Legislativa da Paraíba e ao luto oficial decretado por três dias, apesar da existência de uma condenação em primeira instancia pelo homicídio de sua filha, Márcia Barbosa. Com base nas considerações anteriores, o Tribunal concluiu que o Estado violou o direito à integridade pessoal reconhecido no artigo 5.1 da Convenção Americana, com relação ao artigo 1.1 do mesmo instrumento, em prejuízo da senhora M.B.S. e do senhor S.R.S.


 IV. REPARAÇÕES A Corte estabeleceu que sua sentença constitui, por si mesma, uma forma de reparação. Outrossim, ordenou ao Estado do Brasil as seguintes medidas de reparação integral: 


*A) Medidas de satisfação: 1) a publicação e a difusão da Sentença e de seu resumo oficial, e 2) a realização de um ato de reconhecimento de responsabilidade internacional; 

*B) Garantias de não repetição: 1) o desenho e a implementação de um sistema nacional e centralizado de recopilação de dados que permitam a análise quantitativa e qualitativa de fatos de violência contra as mulheres e, em particular, de mortes violentas de mulheres, 2) criação e implementação de um plano de formação, capacitação continuada e sensibilização das forças policiais responsáveis pela investigação e de operadores da Justiça do Estado da Paraíba, com perspectiva de gênero e raça, 3) uma jornada de reflexão e sensibilização na Assembleia Legislativa do Estado da Paraíba sobre o impacto do feminicídio, a violência contra a mulher e a utilização da figura da imunidade parlamentar, e 4) a adoção e implementação de um protocolo nacional para a investigação de feminicídios; e 


*C) Indenizações compensatórias: pagar os valores fixados na Sentença em virtude da impossibilidade de reabrir a investigação policial sobre os outros possíveis partícipes do homicídio de Márcia Barbosa de Souza; a título de indenização por danos materiais e imateriais; pelo reembolso das custas e gastos, e o montante que permita à senhora M.B.S. arcar com os custos dos tratamentos médico, psicológico e/ou psiquiátrico que sejam necessários. ---- 


 O texto da Sentença, na íntegra, pode ser consultado através do seguinte link: https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_435_por.pdf

sábado, 20 de novembro de 2021

Medidas preventivas da Recomendação 62 do CNJ não se aplicam a casos de violência ou grave ameaça

 


A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o entendimento de que, salvo em situações excepcionais, as medidas previstas na Recomendação 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para prevenir a disseminação da Covid-19 não devem ser aplicadas aos condenados por crimes praticados com violência ou grave ameaça.

O colegiado deu provimento ao recurso do Ministério Público do Ceará (MPCE) para revogar a prisão domiciliar, com monitoramento eletrônico, de um homem condenado por roubo majorado e tráfico de drogas. Ele cumpria a pena em regime semiaberto quando obteve o benefício antecipado.

Segundo o processo, a decisão contestada pelo MPCE – e mantida pelo Tribunal de Justiça do Ceará – se deu em observância ao artigo 5º, inciso III, da Recomendação 62, que prevê a concessão de prisão domiciliar aos apenados em regime aberto e semiaberto, sob condições fixadas pelo juiz da execução.

No recurso ao STJ, o MPCE alegou que o condenado não preenche os requisitos exigidos no artigo 112 da Lei de Execução Penal nem se enquadra nas exceções previstas no artigo 117 do mesmo diploma legal para fazer jus ao benefício. Além disso, sustentou que a prisão domiciliar é incompatível com o regime atual de cumprimento da pena (semiaberto).

Ausência de excepcionalidade que justifique a medida

Em seu voto, o relator do caso, desembargador convocado Olindo Menezes, destacou que o STJ tem decidido pela não aplicação das medidas da Recomendação 62 aos condenados por crimes praticados com violência ou grave ameaça.

Ele apontou precedentes no sentido de que, em situações excepcionais, é concedido o cumprimento de pena em prisão domiciliar aos condenados recolhidos em regime fechado ou semiaberto. Contudo, na situação em análise, "não houve a demonstração de excepcionalidade apta a justificar a manutenção do benefício", disse o desembargador.

"Desse modo, considerando que o reeducando, que não integra o grupo de risco, foi condenado por crime praticado com violência e grave ameaça, deve ser afastada a aplicação do disposto na Recomendação 62/2020, contexto no qual dou provimento ao recurso especial para revogar a saída antecipada com monitoramento eletrônico deferida pelo juízo de execução, restabelecendo o cumprimento de pena em regime semiaberto", concluiu.

Leia a decisão no REsp 1.922.579.

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Material de Apoio da aula 01 - Direito Civil - Curso Popular de Formação de Defensoras e Defensores Públicos

III Curso Popular de Formação de Defensoras e Defensores Públicos

*Peço que não haja o manejo desse material para fins comerciais ou, ainda que gratuitamente, sem a citação da fonte*

Matéria: Direito Civil – Foco em Reais e Bizus de Prova
Pontos do Edital do último Concurso Público para a carreira de Defensor(a) Público(a) do Estado de São Paulo:

24. Direito das coisas. Posse. Teorias da posse. Conceito, classificação, aquisição, efeitos, proteção e perda da posse. Função social da posse. Teorias da função social da posse. Conceito, conteúdo e concretização da função social da posse. Função socioambiental da posse.
25. Direitos reais. Propriedade. Conceito, classificação, aquisição, proteção e perda da propriedade. Evolução da propriedade no Direito brasileiro. Lei de Terras (Lei nº 601/1850). Disciplina constitucional da propriedade. Função social da propriedade: conceito, conteúdo e concretização da função social da propriedade. Função socioambiental da propriedade. Parcelamento do solo urbano. Regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas.


·        Bibliografia/Doutrina

Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. (Também tem o volume único de Reais. Usei durante a faculdade. Não creio que seja necessário ler todo o volume sobre essa parte da matéria. Apenas alguns temas específicos exigem aprofundamento, o que será melhor explicado durante a aula).

Melo, Marco Aurélio Bezerra de. Curso de Direito Civil - Direito Das Coisas. (Somente para se aprofundar. Ele foi Defensor Público no Rio de Janeiro. Hoje é Desembargador no TJERJ. Tem umas teses boas para a defesa da posse, por exemplo, além de comentários sobre o Direito de Laje).


Enunciados das Jornadas de Direito Civil do CJF

·        Introdução
- O estudo para concursos das Defensorias Públicas: Nem tudo que está no edital vai cair;
- Releitura civil-constitucional do Direito Civil, em especial da Posse e da Propriedade;
- Posse e Propriedade: considerações iniciais e a importância da matéria para as Defensorias Públicas;
- Relação com o Direito à Moradia;
- O ponto Teorias da Posse, Aquisição e Classificação caiu nas seguintes provas: DPE/AM 2018, DPE/PR 2017, DPE/SP 2015 e DPE-MA 2015;
- O ponto Direitos Reais/ das Coisas caiu nas seguintes provas: DPE/AM 2018 (3 questões), DPE/RS 2018, DPE/AP 2018, DPE/SC 2017 (5 questões), DPE/PR 2017 (2 questões), DPE/ES 2016, DPE/BA 2016 e DPE/SP 2015.
- Examinadora do último concurso DPE/SP 2015:
Bruna Molina Hernandes
Mestre em Direito pela PUC/SP
Produção bibliográfica:
Dissertação de Mestrado:  A inversão do ônus da prova nas ações de alimentos - baseada na teoria geral de inversão do ônus da prova extraível do Código de Defesa do Consumidor e nos princípios constitucionais. 2012.
Artigo: Tutela antecipada nas ações coletivas como instrumento de acesso a uma ordem jurídica justa e efetiva. Direito & Paz, v. 1, p. 165-212, 2011.

·        - Diplomas Importantes:
CRFB/88;      
Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (artigo XXV – habitação) *Marco Internacional;
Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1996). Promulgado no Brasil pelo Decreto 591, de 06/07/1992 (artigo XI);
Comentário nº 4 do Comitê sobre os Direitos Econômicos Sociais e Culturais: define o que considera uma moradia adequada;

Comentário Geral nº 7 adotado pelo Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU - trata do Direito à Moradia Adequada e de Despejo Forçado;

 

Código Civil/02;

Marco da Regularização Fundiária 13.465/17 e alterações no CC, MP 2.220 e Lei do Programa Minha Casa Minha Vida (praticamente revogada pela Lei de Regularização Fundiária);

Lei nº10.257/01- Estatuto da Cidade.

 




·        Posse

- Teorias: objetiva, subjetiva e sociológica
-
TEORIA SUBJETIVA: VISÃO CRÍTICA

O CC/02 não traz mais requisitos para a posse, sendo sua aquisição fato independente das razões, bastando que o possuidor passe a se comportar como dono. Retirando a implícita intenção de dono na aquisição e perda da posse.

Logo, o CC/02 manteve-se preso a teoria objetiva com perspectiva sociológica. Há autores que sustentam que na usucapião há resíduo da teoria “savigniana”. O Professor Marcílio (DPE/RJ) diverge, entendendo que a intenção de dono que os artigos da usucapião trazem é apenas para deixar claro a diferença de posse contratual (que só se direcionar para a usucapião se houver interversão).

O que é interversão da posse? A Interversão da posse é a inversão da natureza da posse. Exemplo: A posse de boa-fé passa a ser uma posse de má-fé ou a posse justa passa ser uma posse injusta.

 Para posse ad usucapionem a intenção de dono trazida pelo 1238 CC/02 é meramente para diferenciar posse ad contractus (ou posse ad interdicta) da posse usucapionem. A intenção aqui é uma intenção com possibilidade. A doutrina crítica considera que os maiores erros de Savigny foram:

1.     Trata-se de teoria relativista: coloca a posse numa posição subalterna à propriedade;

2.     O enorme valor que se atribuiu ao requisito subjetivo, intenção de ser dono, tornando-o o maior elemento da posse. Prevalecendo sobre o poder de fato sobre a coisa;

3.     No momento em que Savigny só enxerga posse com a intenção de dono ele não consegue enxergar a figura da posse contratual, ou seja, o desdobramento da posse em posse direta e posse indireta;

4.     Savigny negou o uso das ações possessórias pelo locatário/ comodatário/ arrendatário a partir do momento em que não os considera como titulares de direitos possessórios;

5.     Tratava a posse como fato e não como um direito;

6.     O equivocado fundamento da proteção possessória: a razão determinante para a lei proteger a posse para o autor era a necessidade da proteção pessoal do possuidor, porque ele é que tem a intenção de ser dono (elemento nobre e imprescindível – para ele).

Para a Defensoria Pública, essa teoria está ultrapassada!



TEORIA OBJETIVA DE IHERING: VISÃO CRÍTICA


            O Ministro Fachin salienta que o CC/02 adotou a teoria objetiva de Ihering mas enxergando a posse sob os olhos da teoria sociológica da posse.

            A grande importância da teoria objetiva foi a diminuição do elemento subjetivo (tornando-se elemento acessório e implícito). O corpus é o poder físico sobre a coisa, externando para a sociedade um comportamento típico de dono (affectio tenendi - aparência de dono/proprietário).

Logo aqui, ao contrário da usucapião, para se ter a mera posse, basta a aparência de dono. Traz também o elemento negativo de quem não pode ser dono, consoante o disposto no art. 1.198 do CC/02: “Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas. Parágrafo único. Aquele que começou a comportar-se do modo como prescreve este artigo, em relação ao bem e à outra pessoa, presume-se detentor, até que prove o contrário”.

A doutrina crítica aponta os seguintes equívocos cometidos por Ihering:

1.    A teoria é relativista, uma vez que coloca o instituto da posse em posição subalterna;

2.    A posse é o espelho que reflete o domínio. Assim para Ihering, a posse só existe para ser serva da propriedade;

3.    Equivocado fundamento da razão possessória: Para Ihering, a lei protege a posse, porque ao resguardá-la, consolidaria uma proteção ao proprietário, além das ações petitórias já que o proprietário também é possuidor. A doutrina crítica aponta que tal conclusão é equivocada, já que é cabível ação possessória contra o próprio proprietário (sendo muito comum em casos que o proprietário turba a posse do possuidor). Exemplo: casos em que o locador-proprietário quer que o locatário saia e inunda o imóvel.



            TEORIA SOCIOLÓGICA DA POSSE

Não é só uma nova teoria sobre a posse mas uma uma nova maneira de enxergarmos a posse, que deixa de ser relativa e passa a galgar o patamar de direito, em igualdade de condições com a propriedade.

Nitidamente essa visão absolutista da propriedade (que até hoje é adotada pelo Código civil francês que permanece trazendo a propriedade no caput) não foi adotada pelo nosso CC/02, já que a posse é elencada no rol dos direitos reais assim como os demais direitos.

Elementos da Teoria Sociológica:

·                     Corpus
·                     Affectio tenendi
·                     Produtividade
·                     Consciência Social

Foco na Teoria Sociológica da Posse (Perozzi, Saleilles e Hernandez Gil). A posse é um fenômeno social, econômico e jurídico, porém precisa ser exercida conforme a sua função social.

DO DIREITO SUBJETIVO REAL DE POSSE SOB A PERSPECTIVA DA TEORIA SOCIOLÓGICA

Superação da visão da posse como um mero fato jurídico (acontecimento qualificado pela norma jurídica), que era defendida por: Pontes de Miranda, Savigny, Sylvio Rodrigues, Clóvis Bevilaqua e outros.
O CC/02 expressamente reconhece a posse viciada objetivamente (injusta, cf. art. 1200 do CC: “É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária”), como também subjetivamente (posse de má-fé, vide arts. 1201 e 1220 do CC/02[1].
Logo, se enxergarmos a posse como um direito, poderá ser de natureza injusta e de má-fé.


É a teoria que fundamenta as teses da Defensoria Pública.


·        Temas Quentes

a)            O STF[2] já destacou no RE nº 422.349, que área menor dentro de área maior não obsta o reconhecimento da usucapião, desde que sua metragem seja inferior a 250m². Se a lei estadual impede tal direito em razão de não alcançar sua metragem mínima, a referida legislação será inconstitucional.

b)           Direito de retenção: mecanismo potestativo, secundário, para satisfazer o direito de crédito.
c)            Faz um tempo que o STJ já visualiza a possibilidade de posse do particular no bem público, mas que não pode ser oponível ao Estado. Esse reconhecimento representa um avanço contra a ideia de particular como mero detentor[3].
Essa superação em relação ao particular como mero detentor se dá quando há um perigo/ameaça à posse, apresentado por parte de outro particular.
Para a Defensoria Pública o particular é possuidor e pode ser sim oponível ao Estado. Para comprovar tal afirmação, o art. 1º da MP nº 2.220/01 demonstra isso: concessão real de uso – que tem como requisito principal POSSE mansa por 5 anos sobre o bem público. Assim como o art. 183, parag. 1º da CRFB/88 – base constitucional da concessão de uso sobre o bem público, e demonstra a necessidade de exercício da posse de bem público para a efetivação de concessão – destacando sua natureza vinculada (e não discricionária), devendo ocorrer inclusive contra a vontade do poder público.

d)           Produtividade da posse e o caso Favela Pullman - REsp 75659/SP (razão determinante no art. 1.228 ter trazido os parágrafos 4º e 5º: “aquisição do bem em razão da função social”). Em 2005, o Min. Aldir Passarinho, implicitamente, ao manter a decisão do TJSP favorável aos moradores, trouxe o entendimento de que a função social da propriedade depende da função social da posse. A propriedade sem posse é um vazio. Até porque as razões determinantes da improcedência da reivindicação de propriedade foram:
• abandono por parte dos proprietários;
• perecimento jurídico dos 10 lotes, que apesar de terem existência jurídica, houve absorvição do terreno pela favela. Logo, esses proprietários não cumpriram a função social da propriedade. Já que a função social da propriedade é dependente da posse. Essa necessidade de função social da posse é comum em casos de usucapião em imóveis que estão em execução fiscal.

e)            Bem de família do fiador em contrato de locação residencial. Quando falarmos do princípio da máxima efetividade/proteção à dignidade da pessoa humana, falamos em 3 metas fundamentais: proteção física + psíquica + garantia do patrimônio mínimo). Em relação ao bem de família do fiador em contratos de locação, tem-se o entendimento, até então sedimentado, de que "É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação." (REsp 1.363.368 e súmula 549 STJ)
A exceção à impenhorabilidade que decorre de fiança em locação foi acrescentada na lei 8009/90 para fomentar as locações e proteger o mercado imobiliário e acabou desencadeando grande polêmica na doutrina e na jurisprudência em torno do assunto.
Muitos afirmam que essa exceção destina-se a favorecer a moradia, uma vez que facilita a locação.
Por outro lado, vemos essa situação jurídica como uma grave violação ao ordenamento, já que prejudica a moradia do fiador sendo que o imóvel do afiançado permanece impenhorável.

·        Fundamentos Legais para o Amparo da Função Social da Posse

• EC nº 26 que modificou a redação do art. 6º da CRFB/88, incluindo no rol de direitos sociais, incluindo entre eles o direito à moradia digna, que é intrinsecamente ligado à posse, já que esta é elemento concretizador daquela.

• Art. 5, XXIII da CRFB/88: O inciso XXIII vem depois do XXII justamente porque o direito de propriedade é tutelado desde que atenda a função social da propriedade que depende de efetivação da posse “função social da posse”. Para a Professora Ana Rita trata-se de um silogismo: Premissa maior: a função social da posse antecede a função social da propriedade. Premissa menor: o texto constitucional no inciso XXIII prevê expressamente a função social da propriedade.
Logo, temos, implicitamente, a função social da posse resguardada no mesmo dispositivo constitucional. Todo e qualquer princípio constitucional pode vir de maneira implícita, como os princípios da proporcionalidade, devido processo legal e função social da posse. Obs.: para o Professor Marcílio, o texto constitucional não trouxe a função social da posse de forma expressa, porque – durante a Constituinte - ainda vivíamos os resquícios de um regime militar, além do fato de que a sociedade possuía/possui um “fetiche” em relação ao direito de propriedade.
Art 183 da CRFB/88: redução do prazo “elemento facilitador da usucapião” + elemento negativo (só para quem não possui nada em nome próprio) + moradia (é possível ter atividade comercial secundária)
Art 191, CRFB/88: usucapião especial rural. Redução do prazo “elemento facilitador da usucapião” + elemento negativo (só para quem não tem nada em nome próprio) + moradia ( posso ter atividade comercial secundária) + efetiva produtividade rural.
Art 170, V da CRFB/88
• Princípio Constitucional da Solidariedade (art. 3º, inciso i da CRFB/88) :uma das metas desse princípio é a erradicação da POBREZA - O STF, no julgamento da Favela Pullman, já destacou que o principal instrumento da moradia digna é a posse.
OBS: Atentar-se para os diplomas citados no tópico sobre leis/normas importantes!!!
·        Prática/exercícios


(DPE/RJ 2015 - Provão) Diretriz para resposta: O instituto em tela é derivado da função social da posse. Constitui um exemplo claro de supremacia possessória sobre a propriedade. Isto é, a vitória da posse coletiva, que atende a sua função social, sobre a propriedade privada, mediante indenização, até para que não haja lesão ao texto constitucional. Nesse caso, não se trata de usucapião!

Art. 1228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente o possua ou detenha.
...

§4º.O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nelas houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.

§5º. No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.
A posse coletiva ganha mais força do que a propriedade estática. Curioso é que o instituto em tela possui, até o momento, 7 denominações/correntes, conforme a doutrina (óbvio que não seria necessário citar todas as denominações):  

1ª Nova Espécie de usucapião coletiva (Carlos Alberto); É criticada! Não se trata de usucapião.
2ª Nova forma de aquisição pelo binômio posse-trabalho (Maria Helena Diniz);
3ª Desapropriação Judicial (Ricardo Lyra, Nelson Nery, Rosa Maria Nery,  CJF/STJ); 
4ª Desapropriação especial por interesse social (Banca da DPE/RJ);
5ª Expropriação judicial privada pelo binômio posse-trabalho (Tartuce) - evita o uso do vocábulo "desapropriação";
6ª Contra-direito processual (Márcio kammer);
7ª A mais nova tese defensiva obstativa do poder de sequela do reivindicante (Gustavo Tepedino).

Requisitos para o reconhecimento deste instituto, que iremos chamar de "expropriação privada":

*Capacidade de fato: os possuidores deverão ser detentores de capacidade de fato;
*Estado de composse (lei fala em considerável nº de pessoas); Fala-se em, pelo menos, 10 grupos familiares, em sede doutrinária (questionável, também); 
*A propriedade não atendia a sua função social, o que faz surgir uma propriedade coletiva, condominial; 
*Objeto hábil: extensa área, pode ser tanto pública como privada. 

Prof. Marco Aurélio Bezerra de Mello leciona que a proibição na CRFB/88 é em relação à Usucapião. Assim, não se fala em vedação à expropriação (que é o instituto aqui trabalhado na questão).

Tema delicado é a questão da indenização. Segundo o Prof. Marcílio (DPE/RJ), quem suportará é o ente público, a depender do caso (urbana ou rural). Caso seja rural, quem arcará é a União. Caso seja urbano, caberá ao Estado. Para uma melhor visão da questão da indenização ao proprietário, cabe citar o enunciado nº 308 do CJF:

Art.1.228. A justa indenização devida ao proprietário em caso de desapropriação judicial (art. 1.228, § 5°) somente deverá ser suportada pela Administração Pública no contexto das políticas públicas de reforma urbana ou agrária, em se tratando de possuidores de baixa renda e desde que tenha havido intervenção daquela nos termos da lei processual. Não sendo os possuidores de baixa renda, aplica-se a orientação do Enunciado 84 da I Jornada de Direito Civil. 

Isto, frise-se, no contexto da atuação da Defensoria Pública! 

Para complementar, colaciona-se o enunciado 309 da JDC-CJF:

309 – Art.1.228. O conceito de posse de boa-fé de que trata o art. 1.201 do Código Civil não se aplica ao instituto previsto no § 4º do art. 1.228. 


·        Julgados importantes

DESTAQUE
Particulares podem ajuizar ação possessória para resguardar o livre exercício do uso de via municipal (bem público de uso comum do povo) instituída como servidão de passagem. STJ. 3ª Turma. REsp 1.582.176-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/9/2016 (Info 590).


DESTAQUE
É possível o reconhecimento da usucapião de bem imóvel com a implementação do requisito temporal no curso da demanda. REsp 1.361.226-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 05/06/2018, DJe 09/08/2018
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Registre-se inicialmente que, à luz do art. 462 do Código de Processso Civil de 1973, é dever do magistrado levar em consideração algum fato constitutivo ou extintivo do direito ocorrido após a propositura da ação, podendo fazê-lo independentemente de provocação das partes. O legislador consagrou o princípio de que a decisão deve refletir o estado de fato e de direito no momento de julgar a demanda, desde que guarde pertinência com a causa de pedir e com o pedido. Assim, cabe ao magistrado examinar o requisito temporal da usucapião ao proferir a sentença, permitindo que o prazo seja completado no curso do processo judicial. Essa linha de raciocínio também é confirmada pelo Enunciado n. 497 da V Jornada de Direito Civil (STJ/CJF), segundo o qual "o prazo, na ação de usucapião pode ser completado no curso do processo, ressalvadas as hipóteses de má-fé processual do autor". Evita-se, com isso, que o autor proponha nova ação para obter o direito que já poderia ter sido reconhecido se o Poder Judiciário apreciasse eventual fato constitutivo superveniente, cuja medida se encontra em harmonia com os princípios da economia processual e da razoável duração do processo. Na hipótese, havendo o transcurso do lapso vintenário na data da prolação da sentença e sendo reconhecido pelo tribunal de origem que estão presentes todos os demais requisitos, deve ser declarada a usucapião. Além disso, incumbe ressaltar que a contestação apresentada pelo réu não impede o transcurso do lapso temporal. Com efeito, a mencionada peça defensiva não tem a capacidade de exprimir a resistência do demandado à posse exercida pelo autor, mas apenas a sua discordância com a aquisição do imóvel pela usucapião. Contestar, no caso, impõe mera oposição à usucapião postulada pelos autores, e não à posse.







[1] Art. 1.201. É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa.
Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.
[2] Recurso extraordinário 422.349: Repercussão geral. Usucapião especial urbana. Interessados que preenchem todos os requisitos exigidos pelo art. 183 da Constituição Federal. Pedido indeferido com fundamento em exigência supostamente imposta pelo plano diretor do município em que localizado o imóvel. Impossibilidade. A usucapião especial urbana tem raiz constitucional e seu implemento não pode ser obstado com fundamento em norma hierarquicamente inferior ou em interpretação que afaste a eficácia do direito constitucionalmente assegurado. Recurso provido.
[3] Evidente que sobre os imóveis públicos não se pode constituir posse. Entretanto, pode acontecer de um particular exercer poder de fato sobre um imóvel público, como temos constantemente no Distrito Federal e a este particular não pode ser negado o direito aos interditos possessórios quando houver turbação cometida por outro particular. O direito do Poder Público não estará em julgamento, já que a eficácia da sentença da ação possessória atingirá apenas as partes, não sendo oponível ao titular do domínio do bem, ao Poder Público. RECURSO ESPECIAL Nº 1.323.679 - DF (2012/0101219-9). RELATORA: MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI.